segunda-feira, 25 de julho de 2016

Biografias falsas

O meu interesse por Administração surgiu lendo biografias de grandes empreendedores e revistas Exame. Tudo parecia tão fácil, lógico e mágico, como se lidar com pessoas e convergir forças para uma direção comum fosse fácil. Mas eu gostava, era “literatura de saguão de aeroporto” pura, um mundo onde tudo caminha para o sucesso de forma linear.

Biografias de homens acima da média atraem, principalmente, quando envolvem dinheiro. Não conheço ninguém que leu sobre a vida do Einstein, aliás nem sei se existe alguma biografia do Einsten, mas nos anos 1980 e 1990 ficaram famosas as de personalidades como  Akio Morita e Lee Iacocca – esta obra em particular eu achei um porre -. Atraem porque levam a um mundo de fantasia, onde homens poderosos, constantemente bafejados pela sorte, com uma habilidade sem igual nos negócios e uma percepção aguda das oportunidades do futuro os levam inexoravelmente ao sucesso e à riqueza.

É tudo tão certinho, tão preciso, tão sequencial em direção ao podium que não pode ser real, não pode ser verídico. E não é: Tony Swartz, biógrafo de Donald Trump, candidato republicano à presidência dos Estados Unidos, disse que o livro que tornou o empresário famoso nos EUA como gênio nos negócios – A arte da negociação – é totalmente falso, um festival de adulterações de fatos sem precedentes. “Passei batom num porco”, cometou sutilmente à esquerdista The New Yoker.









http://www.newyorker.com/magazine/2016/07/25/donald-trumps-ghostwriter-tells-all

Pensando bem, talvez tenha precedentes. Talvez passar um batom bem vermelho no porco seja o habitual. Talvez quase todas as biografias sejam um festival de mentiras. Fico imaginando como idiotas devem se sentir aquelas pessoas que leem biografias de famosos na esperança de um dia ficarem famosos e ricos um dia. A moda agora é dizer que leem para “copiar o mindset”: acreditam que copiando um suposto jeito de pensar de um vencedor se tornarão vencedores. Neste jogo só quem vence são as editoras e o autores dos livros.

Uma vez uma brilhante professora de administração chamou a Exame de “a revista Contigo de empresários”. Hoje eu acredito que ela chamaria biografias de empreendedores de livros de Harry Potter.

quinta-feira, 21 de julho de 2016

Sétimo livro

Este livro paradidático de aprendizagem de inglês estava disponível e serviu para eu criar coragem de ler um dos doze livros da meta deste ano em inglês. Depois do livro do professor Landes me concedi um refresco.

Ainda estou pesquisando qual livro em inglês eu conseguirei encarar até o final pois será uma experiência ótima:

- Aumentará a minha confiança na língua
- Aprenderei coisas novas
- Quebrará um tabu


sexta-feira, 15 de julho de 2016

Sexto livro

Acho que este foi o mais longo que já li: 600 páginas. Excelente, mas confesso que foi cansativo.


quarta-feira, 13 de julho de 2016

Mais 50 fatos desinteressantes

101) Tenho a pisada do tipo supinada. A sola dos meus calçados desgastam bem mais na parte lateral externa.



102) Nunca consegui terminar um cubo mágico. Andei aprendendo por tutoriais do YouTube, mas o meu cubo era tão vagabundo e duro que desmontou devido ao manuseio rápido e embrutecido.

103) Recebemos educação proletária: o básico do básico para termos um emprego relativamente bom e estável. Dito e feito: dos 6 irmãos, 6 são servidores públicos ou concursados de estatais. Nenhum empreendeu.

104) Ratificando o 103, Não pratiquei esportes nem aprendi a tocar um instrumento musical na infância e adolescência. Não tenho interesse atualmente em nenhum dos dois, mas na juventude desejei aprender a tocar violão principalmente porque existia à época uma lenda que atraía garotas.

105) Entre idas e vindas, fiz 10 anos de psicoterapia. Queria fazer um recall breve de um ano - se é que isto existe - mas perdi totalmente o contato com a psicoterapeuta.

106) Desfrutei de relativa sorte com pedagogas, inclusive casei com uma. Devo ter uma conversa interessante ou ser uma versão gorda do professor Paulo Freire.

107) Perdi a conta de quantas vezes levei choque elétrico de aparelhos energizados e queimaduras de ferros de soldar.

108) Descobri em 2005, na subestação de Ivaiporã, PR, que quanto tensão é muito alta (750 mil volts) se você andar muito rápido leva uma pequena descarga elétrica que parece uma picada de formigano calcanhar.

109) Quando eu estou falando no telefone com uma folha em branco, sempre desenho um rosto masculino bem primitivo. Sempre sorridente.

110) Nunca teria coragem de fazer uma tatuagem no meu corpo. Área é que não falta, mas quase todas as tatuagens que eu vejo são feias e de um mal gosto atroz.

111) Não gosto da comida que no Brasil chamam de "japonesa". Amo a comida que no Brasil chamam de "chinesa". Não sei comer com o hashi.

112) Tenho horror à arquitetura oriental tradicional. Amo, me emociono e fico intrigado com a obra de Gaudi.

113) A pintura que eu mais gosto é "As Meninas", de Velazquez. Tenho uma gravura no corredor do meu apartamento. No mesmo corredor há uma gravura da irmã do Salvador Dali de costas olhando pela janela. Apesar de espanhola, ela tinha um, digamos, "quadril à brasileira".



114) Já fui à Duas Barras, RJ, só para comer um bacalhau supostamente maravilhoso. Não valeu a viagem, no entanto pelo menos conheci o museu do Martinho da Vila.

115) A pior parte da cirurgia de redução de hipermetropia e astigmatismo foi quando senti um consistente cheiro de carne queimando e lembrei que era o meu olho.

116) Falo relativamente rápido e tenho um pouco de dificuldade de ensinar.

117) Conheci duas plataformas de petróleo, em 2006. A sensação de estar enclausurado foi bastante forte.

118) Ainda não tive a audácia de roubar um cartão de segurança que toda aeronave tem disponível para o passageiro consultar em caso de emergência.



119) Um dia depois do meu primeiro encontro com a minha esposa, em 25 de junho de 1999, eu peguei uma forte gripe.

120) Até hoje viro o rosto para não ver a agulha do exame ou da doação de sangue entrar no meu braço.

121) Fazer a coleta para um espermograma pode ser um pouco constrangedor.

122) Entre comprar uma gravura interessante e emoldurá-la o lapso de tempo pode ser tão grande quanto 10 anos.

123) Já fomos sorteados para uma feijoada na quadra da Beija Flor. Já comi melhores, mas a experiência foi divertida.

124) Som muito alto me irrita. Não precisa dizer que eu não gosto de boates e quadras de escolas de samba.

125) Mariah já possuiu quatro carrinhos. Três foram doados e um vendido pela Internet.

126) Passei a ter medo de avião somente após me tornar pai.

127) O único jogo on line que eu participei com relativa frequência foi sinuca virtual, no início dos anos 2000. Desenvolvi uma certa destreza, porém, como não era assinante do site, esperava horrores a minha vez de jogar, a menos que fosse desafiado por um assinante, algo que raramente acontecia. Por acaso observei que era desafiado muito mais rápido se usasse nomes femininos. O efeito inesperado foi a revelação que muitas lésbicas adoravam sinuca virtual. No final eu entrava no site mais interessado em conversar com as minhas colegas me passando por uma jovem quase se descobrindo lésbica, mas indecisa.

128) Só li um livro de Machado de Assis: "Dom Casmurro", e somente em 2015. Capitu nunca cometeu adultério, isto é coisa da cabeça do Bento. Quero ler "Memórias póstumas de Brás Cubas"

129) Sou canhoto, minha esposa é canhota e minha filha é destra.

130) O melhor hotel que eu me hospedei no Brasil foi o Meliá de Brasília. Nos corredores colocaram fotos das celebridades anteriormente hospedadas. Lembro somente da foto do Hugo Chávez. No exterior, o melhor e mais bonito hotel foi o Williamsburg Woodlands, na Virgínia.



131) Em meados dos anos 1990 eu voei num bimotor da Embraer pela primeira vez. O comandante, após contornar o morro do Pão de Açúcar, ligou o piloto automático e começou a ler o Jornal do Brasil sem a menor cerimônia. Todos os passageiros testemunharam porque ele deixou a porta da cabine escancarada.

132) Já ganhamos por sorteio ingressos para um espetáculo de dança da Deborah Colker. Num outro sorteio ganhamos um carrinho de bebê. E só. Em sorteios considero a minha família azarada.

133) O único momento que eu não gosto de chamegos da minha filha é quando eu estou fazendo uma refeição.

134) Nunca dei a menor importância à Espanha e sua cultura até conhecer a minha esposa. O meu caso de amor com o presunto jamón foi tardio.



135) Odeio falar ao telefone.

136) Uma única vez na vida eu tive o orgulho de ser o primeiro lugar em um concurso público nacional. Engenheiro eletrônico de Furnas, concurso de 2004.

137) Os dois livros que mais me impressionaram são "A ética protestante e o espírito do capitalismo" e "Sapiens: uma breve história da humanidade".

138) Tenho um pouco de nojo por chá preto. Não sei o motivo.

139) Uma das minhas fantasias é namorar uma ruiva legítima, com direito a sardas em todo o rosto e cabelos longos e um pouco ondulados.

140) Adoro visitar fábricas e linhas de produção. Já conheci desde pardieiros calorentos que enrolavam transformadores à mão a fábricas grandes, como a antiga unidade da Siemens na Lapa (São Paulo, SP), hoje desativada, se não me engano.

141) A vida eventualmente me reserva tarefas irritantes. Instalar ventiladores de teto e passar fios elétricos em conduítes, por exemplo.

142) Até pouco tempo eu pensava em ser dublador para complementar renda e – principalmente – vaidade, porém para exercer o ofício é necessário antes fazer curso de ator e ser registrado no sindicato correspondente, o que torna os meus fúteis desejos de ter a voz em milhares de lares muito caros e trabalhosos.

143) Detesto quando erram a escrita do meu nome.

144) Por influência da minha mãe, tenho um pouco de receio de comer comida pronta enlatada, mais este sentimento não me impediu de saborear uma feijoada e sopa de tomate Campbell's. A feijoada estava realmente horrível e a sopa de tomate me deu a sensação de eu ser um quadro de Andy Warhol.



145) Ainda fico ansioso ao receber cartas.

146) Já dividi a mesa com um anão num restaurante de beira de estrada no interior do Paraná em 2005. Foi a única vez na vida que eu tive a oportunidade de fazer uma refeição ao lado de um anão.

147) Residências sem muitos livros me incomodam.

148) Quando criança, roubei balas nas Lojas Americanas de Madureira. Não virei bandido, mas só confessei agora porque o crime prescreveu.

149) Planejo quebrar um tabu pessoal e ler um livro que não seja da minha área de trabalho escrito em inglês este ano. Mesmo após dois cursos ainda acho o meu inglês muito ruim.

150) Escrever estes fatos foi mais difícil que eu imaginava. Mais difícil até que encontrar coragem para publicá-los.


segunda-feira, 11 de julho de 2016

Concentre

O que uma aposta na loteria, um trabalho voluntário para um grande evento esportivo e ser sócio torcedor de um clube de futebol tem em comum?

Uma aposta de loteria tem um custo baixo, uma aposta típica no Brasil custa em torno de um dólar somente. Não pesa no bolso nem fará ninguém mais pobre ou menos classe média. Talvez seja apenas um refrigerante em lata que deixou de ser bebido para virar um papel carregado de esperança. Se ganhar, o dono deste papel ficará imediatamente milionário. Sim, prêmios das loterias da Caixa Econômica Federal podem ultrapassar os 20 milhões de dólares, quando acumulados. A probabilidade, a chance do sonho se realizar é bem baixa e chega a uma em 50 milhões. Compare com a chance média de uma pessoa qualquer morrer num acidente aéreo, algo em torno de uma chance em 10 milhões. É cinco vezes mais fácil morrer viajando de avião comercial que acertar as seis dezenas.

Do outro lado da cidade, uma pessoa se candidata a ser voluntário em algum evento esportivo. Os motivos que levam uma pessoa a gastar o seu bem mais precioso – o tempo – em ensaios e na atividade voluntária para mim são nebulosos. Os argumentos são sempre emotivos, como era de se esperar: “participar”, “fazer história” ou mesmo “chegar bem perto do meu herói”. Por “herói”, considere normalmente uma pessoa famosa por seu desempenho esportivo fenomenal e por isso recebe uma remuneração vultosa amealhada por patrocínios e publicidade.

Por fim, um amigo meu disse todo orgulhoso que era sócio torcedor de um clube carioca. “Qual é a vantagem? ”, perguntei. Ele respondeu de pronto “Nenhuma. Não ganho ingresso grátis para jogos, não ganho acesso às dependências do clube, nada. É só para ajudar o time de futebol”. Ele contribui com 20 reais todo o mês para ajudar o clube a pagar um salário de 6 dígitos ao atacante.

O nome disso tudo é concentração de renda. Sim, nós estamos acostumados a criticar a concentração de renda, de ver nos jornais que o país é supostamente injusto por concentrar renda ou ouvir economistas falando que inflação concentra renda.

A sociedade adora concentrar renda. Você comprando um bilhete de loteria transfere renda do seu bolso e dos demais jogadores para o ganhador do prêmio. Bom, pelo menos neste caso você pode ser o ganhador e neste caso remoto, o beneficiado por der você, mas trabalhar de voluntário num grande evento esportivo ou ser sócio torcedor de um grande clube é, sem dúvida alguma, concentrar propositalmente renda sem nada objetivo em troca.

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Uma noite com os pobres

Certas lições necessitam ser revistas periodicamente pois nos acostumamos fácil com o ambiente quando melhoramos de vida.

Esta semana eu prometi à Mariah que iria comprar o Disney Gogo's do Mickey e Minie dourados e que foram uma febre no ano passado. Encontrei por 18 reais o par e, para economizar nas despesas postais, decidi buscar pessoalmente num bairro próximo ao meu trabalho e a minha casa, porém um tanto contra-mão, como chamam popularmente aqueles locais de difícil acesso a despeito de perto.

Procurei na internet, mas as linhas de ônibus, o trânsito e o sentido das ruas mudaram tanto na cidade nos últimos meses que eu me senti inseguro. Algumas informações claramente estavam desatualizadas. Felizmente eu tenho a amizade do Farinha, a maior autoridade viva quando o assunto é deslocamento pelo subúrbio carioca.

- Pega o 313 que não tem erro!

Eu, acostumado com o relativo conforto dos ônibus que eu pego diariamente, embora imundos, pichados com textos pornográficos e velhos, não são superlotados e estressantes. Esqueci completamente como as condições de vida de quem mora no subúrbio profundo são ruins. Entrei uns 2 ou 3 pontos do início da viagem e isto me gerou a doce ilusão que não iria lotar apesar do relógio marcar umas 18h. Acreditei que não seria necessário sentar próximo à porta de saída. Ao chegar na Central o desengano desapareceu. Alguns metros depois nova parada num ponto próximo a uma universidade privada e mais passageiros. "Não, não deve entrar mais ninguém na Leopoldina", pensei, já preocupado e montando um mentalmente um sofisticado procedimento para saltar logo depois.

O ônibus estava tão cheio que o deslocamento foi quase impossível e eu considerava a possibilidade de saltar depois do local desejado. A educação fica em segundo plano e o empurrão forçando a passagem entre pessoas sofridas e exaustas que estão em pé no corredor vem logo em seguida do pedido de licença. Vamos em frente até a proximidade da escada. Parando o ônibus tenho que aguardar as pessoas levantarem da escada de descida e saírem do ônibus temporariamente para me deixar passar. No solo, mas não mais seguro. As lojas já estavam fechadas e o ambiente me lembrava cenário de filmes do submundo de Nova Iorque dos anos 1980. Embaixo da Linha Vermelha, o que eu via eram sucateiros, lixo, população de rua e iluminação deficiente.

De fato, a dica do Farinha foi providencial e certeira, estava a apenas cem metros do endereço de destino. Comprei os Gogo's e saí. Com um pouco de medo e cheguei a considerar a possibilidade de pegar um táxi, porém a economia por ir buscar pessoalmente se perderia e segui em frente, rumo ao ponto do 665. Prostitutas já estavam nos seus postes e árvores de costume e o meu destino era longe, em frente ao hospital Quinta D'Or. No meio da caminhada um taxista parou logo na minha frente e rapidamente fechou negócio com uma garota de programa morena, que com eficiência entra no carro e partem.

No ponto, um trecho mal iluminado da margem da Quinta da Boa Vista, um casal com roupa de escola do municipal namora encostados nas grades. Mais dois colegas de sofrimento aguardam o ônibus com paciência e este milagrosamente chega rápido. Estava com o interior tão escuro que eu cheguei a pensar que estava indo para a garagem. Fiz sinal, parou, embarquei e além do motorista mais dois passageiros seriam os meus colegas de viagem nos próximos minutos. O veículo, com defeito no câmbio, irritava o motorista por não aceitar a terceira marcha e eu, reflexivo, relembrei como a vida dos pobres é difícil e como a ascensão social é quase uma lenda no Brasil.

As pessoas que pegam o 313 e o 665 são pobres, moram em lugares longínquos como Complexo do Alemão ou Pavuna, seus trabalhos são basicamente braçais, não intelectuais. É tudo contra: durante a jornada de trabalho ele não tem como dar uma escapadinha e estudar, o ônibus, lotado, trafega um vias congestionadas o que faz a viagem se tornar uma longa tortura. Não dá para ler pois a maioria viaja em pé e, mesmo que estivesse sentado, a iluminação interna do ônibus é péssima. Ao chegar em casa será quase um morto vivo com uma série de tarefas domésticas pendentes. Seus vizinhos e amigos de bairro são tão pobres e carentes quanto ele. O circulo se fecha ao não conseguir estimular o filho a ler. Talvez não tenha a mínima noção que a única saída deste inferno é investindo em conhecimento. Dele e dos filhos.

Jesus disse aos apóstolos, respondendo a um questionamento de Judas que "pois os pobres vocês sempre terão consigo, mas a mim vocês nem sempre terão" (Mt 26:11). A passagem de Jesus pela Terra foi curta, menos de 40 anos e os pobres são eternos. É paradoxal e surpreendente que Jesus diga categoricamente que Ele, Deus em carne, não esteja para sempre presente, convivendo com eles, mas o pobre, sim. Não vejo aqui uma crítica ao capitalismo, até porque a qualidade de vida dos pobres do tempo de Jesus são infinitamente melhores hoje. Isto é mérito principalmente da ciência, do aumento da produtividade e da economia de mercado. Uma vacina é um exemplo clássico de melhor ciência, que leva ao descobrimento da prevenção de doenças, com o capitalismo, que a permite chegar à população. Os pobres são vítimas eternas de um sistema cruel que os próprios pobres de certa forma participam. E participam por ignorância, conformismo e perpetuação reprodutiva. Vejamos cada uma.

A ignorância faz com que o pobre cometa pequenos delitos crendo que está a vingar-se ou que é inofensivo. O caso mais clássico é o roubo de sinal de TV por assinatura. Neste caso ele acredita que é indolor para a operadora porque o sinal já está lá e o seu consumo não afeta em nada o serviço prestado aos outros, além do fato dele deixar de pagar ser uma queda de receita ínfima. A sensação de vingança ocorre quando ele testemunha notícias de corrupção e se julga mais esperto que os políticos e empresários pirateando o serviço. O mesmo ocorre com outros serviços como eletricidade e água ou o jogo de videogame pirata. O ponto é que, se ele não tivesse acesso ao serviço de TV por assinatura nem ao videogame ele poderia estar usando este tempo para ler, estudar e aprender coisas novas. No lugar de melhorar como pessoa e tornar a sua mão de obra mais qualificada e produtiva e, como tal, mais valiosa e desejada pelas empresas, ele se emburrece cada vez mais, tornado-se mais vulnerável ao desemprego e aos salários mais baixos. A suposta economia com a TV a cabo e o jogo de videogame na verdade tem um curso altíssimo a longo prazo.

O conformismo faz o pobre aceitar a sua condição baseado no medo e em pessoas próximas. Isto não isto não é exclusivo de alguma classe social; a classe média é medrosa de doer, mas é no pobre que o conformismo tem os seus efeitos mais nefastos porque a classe média, por definição, tem uma vida melhor e mais confortável que o pobre e permanecer na mesma situação ad infinitum não é de todo mal. O pobre típico tem a autoestima baixa, ele não acredita que pode porque ele olha os seus amigos e generaliza. Se estamos todos no mesmo barco, o que eu tenho de especial para me destacar dos meus vizinhos? Absolutamente nada! O nosso cérebro é craque em generalizações.

O terceiro problema é o mais cruel, a perpetuação reprodutiva. Normalmente os pobres geram filhos mais cedo, quando a estabilidade econômica é um sonho remoto e a maturidade plena ainda não chegou. Boa parte destes filhos são indesejados, mas mesmo os desejados estão em condição de desvantagem antes de nascer. A quantidade de filhos por família também é maior entre os mais pobres, o que diminui a atenção individual que os pais podem dar. Os pais pobres conversam menos com os filhos e passam pouco tempo com eles, o que não os estimulam.

Não quero dar uma visão pessimista ou justificar a pobreza. Pelo contrário, eu modestamente sou um exemplo de como sair da maldição de Mateus 26:11. Meus pais  tinham pouca educação formal e papai morreu quando eu tinha seis anos (ignorância), morando num bairro muito pobre (conformismo) e geraram seis filhos (perpetuação reprodutiva). Qual o meu segredo? Qual o caminho de saída deste Labirinto de Creta?

Meu pai era filho de professor e valorizava a educação. Quando ele morreu o meu irmão número 1 tinha 26 anos e o número 2, 24. Ambos solteiros, fui tutorado e estimulado intelectualmente. Aos 14, o número 2 pagou um curso preparatório e me incentivou fortemente a tentar estudar numa escola melhor. O salto começou naquele distante março de 1986. Ao estudar numa escola de classe média em um bairro de classe média rompi definitivamente com a ignorância e o conformismo. Lembro de uma vez, por estímulo de um amigo, fazer a prova para sargentos do Exército. O irmão número 1 me deu uma bronca inesquecível: se quiser ser militar, que seja oficial e dispute uma vaga para a Academia Militar das Agulhas Negras.

Pense grande, pois você pode estando preparado estudando muito. Descobri, prematuramente no segundo grau, que a classe média não tem nada de diferente de mim na essência. A maioria dos meus colegas de bairro só descobriram a classe média ao entrar no mercado de trabalho, adultos, onde a soberba e humilhações são bem maiores. Não viram a semelhança.

Outros fatores, importantes, mas que eu considero menores: fui pai tardio, tenho apenas uma única filha e consegui um bom emprego que me permitiu fazer um curso superior numa escola federal.

Mas eu continuo conformista. Tenho a certeza que atingi o meu limite. Está bom. O próximo degrau quem pode subir é a Mariah. Ela esta sendo preparada desde antes do nascimento para este salto. Procuro ser o melhor e mais estimulante pai do mundo. Espero que não dê tudo errado e ela não vire uma adulta chata e mimada.